meu bem, nosso tempo é outro
nosso tempo é nunca
perdemo-nos
as horas não marcam o nosso compasso
zero
vago
o tempo em suspenso
eu a recitar versos de um adeus implícito
tu em silêncio
.
.
.
meu bem, nosso tempo é outro
nosso tempo é nunca
perdemo-nos
as horas não marcam o nosso compasso
zero
vago
o tempo em suspenso
eu a recitar versos de um adeus implícito
tu em silêncio
.
.
.
às vezes confundo o mundo real com aquele que eu fantasio, mas a realidade sempre bate gelada na minha porta
e me sacode
“pare”, ela sussurra rígida
me encolho dentro e fora de mim
me afasto quieta
perco a fantasia
e abro a porta
ter pra onde voltar:
os pés conhecem o caminho
pé ante pé seguem rumo ao lar
cantarolo canções enquanto me encolho (o corpo sente frio), penso na recepção dos cachorros e sigo inconscientemente (os pés sabem onde devo parar)
chaves, boas noites, os cães saudosos lambem minhas mãos: amor. casa.
a saudade alerta que há vazios, mas também abriga
estamos em casa
estou em casa
a verdade é que eu queria te participar da minha vida
falar das coisas que me deixam feliz e também daquelas que me deixam triste
perguntar qualquer bobagem que eu possa desconhecer só pra ouvir sua voz a me contar
quem sabe dormir no seu ombro e acordar com o peso da sua mão na minha cintura em um convite só nosso
queria te fazer parte de mim e ser parte de ti
sem precisar fingir uma indiferença
expectativas minhas
que nunca irão se concretizar
o quase
no meio do caminho
aquilo que não é, nem deixa de ser
o meio termo
aquele que vai sem ir e sem ficar
no limiar
entre o que poderia ter sido e que não foi
a vida
a morte
a coisa qualquer que existe nesse meio
a loucura sã
a sanidade louca
eu, controlando minha loucura há tanto tempo que já não sei que máscara vestir: aquela que sorri?
abro meu armário sem saber quando será o amanhã
sigo sendo morna, sendo nada
os doze dígitos de um documento
as iniciais que não dizem nada sobre mim
sou o quase
uma a uma, fui me perdendo em ti
cada camada minha despida
partes que tu vestiu
como um encaixe todo nosso
então fui poesia:
inventei rimas e palavras
sorvi o meu prazer mesclado ao teu
derreti pouco antes do fim
vertida em água
com a boca seca
de uma saliva que se transferiu
em uma união de nós dois
vamos tomar uma cerveja?
trocar uns beijos?
me pega no colo, na rua, o cheiro de cerveja passando de ti pra mim e vice-versa
silêncio
não há cerveja
nem beijos, colo ou rua
deparo-me com todas as vontades saltando de mim e eu tendo de contê-las
desejo felicidades
e parto
A garganta fechada só queria dizer as coisas que estavam entaladas. Gritar não era o suficiente para expelir a quantidade de informação acumulada, e Deus sabe o quanto tive que resistir para não dizê-las todas ao mesmo tempo.
O sentimento ultrapassava a distância de dois corações. Choramos, unidas pelo sentimento que ultrapassa a distância.
Amor, segundo o dicionário, é “3. afeto, carinho, ternura, dedicação”, e eu ainda achei essa definição pequena perto daquilo que nos une. Pequena perto daquilo que está guardado no peito. Daria uma outra definição qualquer, mas, consciente da impossibilidade de abarcar todo esse sentimento, limito-me a dizer que amor é chorar ao mesmo tempo por uma dor que nem é sua (ou talvez seja); sorrir por uma alegria que também não é sua (vai ver também seja); e conversar com os olhos. Saber exatamente o que se passa no coração do outro, sem utilizar uma palavra sequer.
Amor se traduz no seu nome. Forma-se com suas letras, todas sincronizadas na mesma sincronia do nosso sentimento, das nossas lágrimas, dos nossos sorrisos e dos nossos olhos.
acordei de um sonho bom
a realidade às vezes endurece a gente: no sonho, eu fazia exatamente aquilo que sentia vontade. sem receios, sem o medo iminente de qualquer coisa explodir nas minhas mãos.
sonhei banalidades: rua, risos, beijos, colo, verdades…
acordei com a frustração de mais um dia quieto, outra manhã morna em que todos os meus desejos se esvaem pela janela. acordei adolescente – insuportavelmente dramática. a menininha aquela que se sentava na primeira cadeira, com sua agenda e ombros encolhidos para esconder-se de qualquer um que tentasse (me) ler.
a gente sempre acaba criando um refúgio, até quando não há. meu mundinho inventado ainda existe em algum lugar, ainda que nem sempre eu consiga acessá-lo.
no sonho, consegui estar exatamente onde gostaria.
– acordei –
abismo
o vão da cama me puxou pra dentro
um emaranhado de medos-perigo-incerteza-tédio e falta
quis fugir sem ter pra onde
(aquele
cubículo
me expulsava
de mim)
submergi
tempo suficiente para sufocar
e nadar de volta à superfície